quinta-feira, 15 de abril de 2010


O que é texto?


Há, pelo menos, três noções do que vem a ser um texto:


• Um artefato (produto) da inteligência de um autor;

• Um evento comunicativo: esta visão está bastante ligada às funções de linguagem de Jakobson, que lançava holofotes sobre a mensagem e delimitava o emissor como componente ativo e o receptor como passivo;

• Hoje, prevalece, no entanto, a noção de texto como um acontecimento sociocomunicativo cultural e cognitivo: segundo essa perstiva, o foco de um texto é a interação entre locutor-texto-interlocutor, assim, não há passividade, pois um “leitor”, ao ler um texto participa do processo de construção de seu sentido, fazendo, a todo instante, inferências, isto é, preenchendo as lacunas de um texto.


Para compreender melhor, vejamos o exemplo de uma tirinha, produzida pelo artista Carlos Ruas Bon, autor do blog um sábado qualquer.

EXEMPLO 1:



Então, feita a observação da tirinha acima, podemos constatar que, nós leitores, no momento da leitura, construimos uma unidade de sentido para o texto, portanto somos parte ativa na interpretação deste. Preenchemos, assim, diversas lacunas que o texto suprime em sua superfície, como, por exemplo, indentificamos um personagem como Deus – para isso recorremos em nossa mente à “informações prévias” acerca da figura de Deus. De acordo com o nosso conhecimento culturalmente compartilhado, quem mais trabalhou seis dias e no sétimo descansou? – reconhecemos outro personagem como homem, ainda utilizando o mesmo tipo de conhecimento, isto é, de acordo com nosso conhecimento de mundo – construido socio-culturalmente – inferimos que o personagem que figura ao lado de Deus pode ser um homem, por estar em um plano bem reduzido em relação a figura de Deus e por figurativizar uma “imagem” que já temos contruida como a representação de um homem etc. No texto não está explicitado que o período de carnaval é feriado nacional, mas essa informação também é inferida por nós.
Vamos observar outro exemplo.
* EXEMPLO 2:



Do mesmo modo como foi abordado no exemplo 1, para que o leitor possa construir o sentido da tirinha acima e para que o objetivo de causar o riso seja satisfatório, várias inferências são feitas no momento da leitura.
O conhecimento de mundo é mobilizado e assim o leitor é capaz de identificar a relação entre os personagens e entender a alusão que o texto faz ao criacionismo x darwinismo. É, porém, muito importante lembrar que esse conhecimento “ativado” no momento da leitura parte da superfície do texto, isto é, parte de marcadores linguíticos; como, por exemplo, do excerto “..mais alguns milhares de anos” que nos autoriza a relação com a teoria do evolucionismo, de Darwin, segundo a qual, partindo de um ancestral comum, os seres evoluem ao longo dos anos, até obterem a forma que tem hoje. Além do mais, temos, antes de tudo, a representação dos personagens, que apesar de constituirem desenhos também fazem parte do texto.

Três são os tipos de conhecimento que mobilizamos no ato da leitura, que, de acordo com Koch (2002), são três sistemas de conhecimento: linguístico, enciclopédico e interacional:
• O conhecimento de mundo: conhecimento construido socio-historico e culturalmente. É um conhecimento bem geral e que é compartilhado pelos integrantes de uma sociedade;

• O conhecimento linguístico: conhecimento que nos permite observar, por exemplo, se uma sentença está bem constituida do ponto de vista morfológico, sintático, semântico e lexical. “Segundo Koch e Elias (2006), tendo por base esse conhecimento, compreendemos: a estruturação linguística dos enunciados, o uso dos meios coesivos e a seleção lexical adequada ao tema”. Para ilustrar melhor, vamos ao exemplo:

** “ Rubinho é um ás no volante.”
Para apreendermos o sentido do trocadilho, reconhecemos a algutinação de ás e no = asno. Tal conhecimentos é da ordem linguística.

• O conhecimento interacional: conhecimento que nos permite identificar o tipo de texto, suas sequências e seu gênero e, ainda, por extensão da identificação do gênero, nos permite identificar, ainda, o provável meio de sua circulação, suas intenções etc. Vamos ao exemplo:
Galinha Escabelada
Ingredientes
um peito de frango
uma cebola
dois tomates
temperinho verde
extrato de tomate
batata palha
queijo mussarela
Modo de Preparo
cozinhe o peito de frango e desfie, pique a cebola e os tomates, refogue a celoba e o tomate coloque o extrato de tomate e o temperinho verde. Coloque num refratário o molho de frango e por cima a batata palha e por cima da batata coloque o queijo. Coloque no forno numa temperatura de 200 graus até o queijo derreter e está pronto para servir. Para o acompanhamento: um arroz branco. ( retirado do site maisvocê)

Ao lermos o título do texto acima, naturalmente, preparamo-nos para a leitura de um texto do gênero receita e identificamos, sem muito esforço, diversas iformações sobre texto, partindo do conhecimento de seu gênero. Assim sabemos que o texto tem um proppósito comunicativo, o de ensinar alguém a fazer algo e que tal tipo de texto é comumente constituído por duas seções: primeiro, uma parte que lista os ingredientes e a outra reservada ao modo de preparo: parte que contem instruções de como se deve fazer.
Esse diálogo tem o compromisso de complementar, através dos exemplos e ilustrações, o nosso conhecimento sobre texto. Entendemos e ilustramos melhor:

• Os conceitos de texto;
• A atual concepção de texto como interação locutor-texto-interlocutor;
• A definição e ilustração dos três tipos de conhecimento – de mundo, linguístico e interacional.

Por fim, espero que tenha sido de alguma utilidade e, motivada por esse desejo e pela colaboração de todos, deixo uma abertura para outros debates como esse. No próximo, abordaremos a concepção de propósito comunicativo e daremos início a conceituação de fatores de textualidade, termo analisado no texto texto e textualidade, de Costa Val, disponível na xerox da boblioteca.
*Tirinha presente no artigo Intertextualidade e construção do sentido risível no gênero tira de humor de autoria das alunas Ana Maria Cavalcante, Cíntia Araújo, Jane Mara Ximenes e Maria Tatiana Silva, foi apresentado à Profª Drª Maria Margarete Fernandes como atividade para obtenção de créditos na disciplina Linguística de Texto
**Conceito e exemplo retirados do material didático da disciplina de Texto e Discurso, ministrada pela Profª Drª Mônica Cavalcante, no semestre 2008.2.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
KOCH, Ingedore V. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, 2002.
KOCH, Ingedore G.V.; ELIAS, Vanda Ma. Ler e compreender os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2006.
www.umsabadoqualquer.com; acessado em 06 de março de 2010.

Nenhum comentário:

Postar um comentário